sexta-feira, junho 30, 2006

Ensaio sobre a contenção

Não, não vou falar de gases ou de massas obscuras expelidas por ânus humanos, nem tão pouco de verborreias descontroladas que um acender de ânimos suscita. É da outra, da outra contenção...a de sentimentos, de desejos, do eu quero e pronto.

Porque raramente dizemos o que pensamos? Porque raramente expomos o que sentimos? Porque não pedimos o que nos faz falta...aos outros?

Contenção. Aprendemos e não sei muito bem como, que dar largas ao que nos vai na alma pode ser mal interpretado, mal visto. Não queremos ser rotulados de infelizes ou loucos e tememos a chacota dos nossos pares. Escondemo-nos, então, sob a máscara do socialmente correcto e apenas ao amigo/a do peito vamos desenrolando a nossa miséria do momento.Contenção. Aprendemos a calar o que pode fazer de nós seres confusos ou dignos de pena, porque qualquer sentimento negativo verbalizado, gritado, é sinal de desequilíbrio. Aprendemos sim a servirmo-nos da manha para alcançar os nossos fins ou, na falta dela, explodimos em incongruências, provocamos desentendimentos, partindo do princípio que o outro, os outros, deveriam adivinhar o que queremos, o que nos incomoda.

Camas geladas, desencontros em corredores estreitos, provocações, palavras amargas e desnecessárias quando seria tão mais simples um "dá-me jinhos que estou de rastos". Pediriam isso aos vossos colegas de trabalho? Ao vosso vizinho? Ao estranho que passa na rua?
Toca-me...foi isso que me pediu sem falar aquela velhota, no outro dia lá no supermercado. Encostou-se, braço com braço, em frente à bancada da fruta...não havia mais ninguém. Desviei-me...encostou-se. Olhei, sorri e ela falou, primeiro da fruta, depois dos preços e por fim perguntou-me "A menina é feliz?" e o resto veio por arrasto. Não se conteve.

Mas que espécie a nossa, em que a inteligência e suposta racionalidade exigem que o que me faz falta seja calado e que o que me mói dominado!Em alhos esmagados, cama de cebolas...jaz o idiota que chora, que dos fracos não reza a história...

Imagem de Misha Gordin

2 Comments:

At sexta-feira, 30 junho, 2006, Blogger Maeve said...

Boa noite :)

 
At sexta-feira, 30 junho, 2006, Blogger Teresa Durães said...

Continuo a pensar o mesmo.

Está no Toca-me!
Está no afecto que parece ter deixado de existir. Na solidão. Está no medo de dizer o que sentimos por medo que os outros nos abandonem (continuo a seguir o "mais vale só que mal acompanhada").

- e já vi que mais dia menos dia vais andar em arrumações com o blog ;)

 

Enviar um comentário

<< Home